segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

os meus vários namorados

Sou uma péssima aluna. Pois sou infiel. Desde que entrei no mestrado tenho descoberto isso. Quando era professora, exigia fidelidade dos meus alunos. Besteira! Hoje, percebo que não consigo executar o que tanto idealizei: não consigo viver apenas e unicamente para estudar, pois outras coisas lá fora me chamam a atenção. Muitas vezes o João do Rio, o Nelson Rodrigues, o Plínio Marcos ou o Cartola me fazem muito mais sentido do que o Habermas.

Tenho um professor no mestrado que, desde a primeira vez que me viu chorando de desespero por conta das obrigações acadêmicas que eu não conseguia cumprir, me diz: "termina com seus outros namorados". Ele sempre repete isso, toda vez que me vê. Fica até chato, pois sempre me sinto a maior das falácias quando escuto esse imperativo. Eu e o meu chicotinho, sempre me desvalorizando...

Na verdade, até concordo com o experiente professor. E demorei a entender o que esse comentário poderia significar. Hoje penso que talvez ele tenha razão. Talvez. Não estou totalmente certa, mas tenho notado que, de fato, chega um momento que temos de rezar na cartilha. Aceitar a submissão a uma lógica quatrocentona que é também colonizadora. Precisamos abandonar nossos outros prazeres, nossos outros compromissos, nossas outras preocupações para nos dedicarmos a uma só: a pesquisa. Ou o que nos propomos fazer quando da seleção do mestrado. O que chamamos de pesquisa, mas que na verdade quer dizer apenas um mergulho. Um mergulho inicial a um universo diferenciado. Ainda mais quando não temos tradição em pesquisa, quando não sabemos ao certo como pesquisar, o que é uma pesquisa.

Aí é que temos de ver nossos hábitos mudarem. Pois há todo um ritmo e um universo, toda uma adaptação do corpo, da mente, do espírito que deve estar voltada para a pesquisa. É literalmente um exercício cartesiano. Não deveria ser. Mas a academia exige que seja. E eu tenho me sentido bastante impotente para lutar contra. Separar o lado esquerdo do direito do cérebro; adormecer a fantasia... Quem diria? Não deveria! Mas se estão a pedir para que termine com os outros namorados, então isso quer dizer que deixe quietas as minhas sensações e exercite a racionalidade. Ao extremo. Será?

Por isso que aos poucos eu venho ouvindo o conselho desse professor e terminando com meus outros namorados. Os projetos, o cinema com a avó, o teatro, a poesia, a boemia, a cachoeira, as viagens, o namorado de verdade, a família, aquelas conversas longas de fim de tarde na cozinha, enfim... Com tudo isso tive que romper. Nem que apenas temporariamente. Sob pena até de ficar triste e amputada.

E confesso que tem sido difícil.

Mas deve valer a pena.

É uma forma de crescer.