domingo, 23 de setembro de 2012

o amor segundo Patrícia Galvão



“Toda a vida eu quis dar. Dar até a anulação. Só da dissolução poderia surgir a verdadeira personalidade. Sem determinação de sacrifício. Essa noção desaparecida na voluptuosidade da dádiva integral. Ser possuída ao máximo. Sempre quis isto. Ninguém alcançou a imensidade de minha oferta. E eu nunca pude atingir o máximo do êxtase-aniquilamento: o silêncio das zonas sensitivas.” 


Não havia muito que fazer nos últimos tempos, a não ser dedicar-me com afinco à contemplação. Estava sentada em um banco da Praça da Liberdade, fazendo a sesta de uma segunda-feira distante da rotina. Apenas os pássaros eram meus companheiros para aquela tarde tranquila. O céu estava brilhante e cada folha derrubada da árvore pelo vento era um acontecimento. Buscava algo que me fizesse enternecer. 

Abri um livro recém-adquirido no sebo. Paixão Pagu, autobiografia de Patrícia Galvão. Texto propício para o momento em que encerrava minha “formação feminista”. Tratava-se de uma carta escrita por Pagu a seu último companheiro, Geraldo Ferraz, narrando, com minúcias, o extremo da dedicação ao Partido e todas as consequências disso. Li com os sentidos aguçados, considerando importante ir além da Pagu "exibicionista" ou das poesias "nothing".

À página 52, deparei-me com palavras de sentido. Era justificativa para o vazio que se abre na mesma medida em que crescem os impulsos de afeto e doação. Era consolo para os desejos de abraçar e que, quiçá, nunca serão sanados. Até então não havia explicação para um sentimento similar ao amor. Enterneci. Não era o que me inquietava propriamente, apenas encontrei mais uma vez em Pagu algo de identificação. Sentia, como mulher, por pessoas, causas e situações, o que não sabia dizer. Desde então, fiz minhas suas palavras.