quarta-feira, 5 de setembro de 2012

sobre o pranto

Dias antes de sua partida, consegui dizer que a amava. Ela respondeu com um beijo seguido de "eu também". Seu cheiro era de banho tomado e sua pele tinha uma camada fina de creme hidratante. Naquele dia, sua decisão de nos deixar estava tomada. Havíamos nos preparado, mas ainda assim fomos surpreendidos com a brevidade dos acontecimentos. Quando a notícia chegou, cruzei divisas, com algumas lágrimas deslizando por entre os cílios e os óculos, mas muito esforço para escondê-las.

Durante a despedida, estávamos todos sérios, tristonhos, cansados, peito apertado. Ninguém, porém, deixando que o pranto aparecesse. Devidamente comportados, evitamos que ela se incomodasse, depois de tanto viver de abalos e por nós. De minha parte, quis também seguir o ritual dos fortes, mantendo o acordo de gerações.

Os dias passaram e qualquer sentimento de falta ou saudade foi devidamente escondido por entre as penas do travesseiro. Minha mãe fez o mesmo, desaguando em suspiros secos. Até que ela resolveu voltar. Parou no meio do caminho, pois cada lágrima represada formava uma grande poça em sua estrada.

Abraçou-me forte, disse algo a mais que não me lembro, voltou a despedir-se repetidas vezes.  Desejamo-nos sentimentos bons e calmos e, enfim, choramos. Sentindo cada pingo que cortava meus lábios, sem restrições, fui despertada pelo sol. Olhei em volta, o quarto vazio. No lugar de seus chinelos de pano pairava um alívio doce, além de algumas suspeitas de amor. Como última lição, revelou-me: "Lágrimas são para correr!".