sábado, 5 de junho de 2010

intolerância e revoltude

Quando eu tinha 12 anos sequestrei uma coleguinha da natação e a levei para Campo Grande.

Como?

Nós íamos para um campeonato e ela não ia. Íamos porque tínhamos de 9 a 12 anos e ela tinha 13. Ela queria ir e não podia. Não sabia como. Aí a Nádia e eu tivemos a brilhante ideia: Liliane, por que você não vai escondida no ônibus? Ela topou na hora. Pensávamos que isso não nos traria tantos problemas e que, uma vez em Campo Grande, nada mais poderia ser feito.

Ela arrumou uma mochila e, no dia da viagem do grupo, se escondeu no ônibus. Jogamos todas as malas sobre seu corpo pequeno, espremido no chão do carro, entre uma poltrona e outra. E assim ela foi. E assim fomos nós. Nádia e eu sobre Liliane, dando-lhe cobertura.

Fazia muito calor. Ela tinha sede. Inventamos uma série de desculpas para justificar aquele aperto todo. "Muitas malas". Para mim foi um grande sentimento de espírito de equipe. Três se esforçando enormemente para realizar o desejo de uma. Que queria passear, conhecer Campo Grande. Só isso.

Mas, que decepção! Em Rio Verde, fomos descobertas. E a Andrea não nos perdoou. Chamou a polícia. Fez a turma ficar contra nós duas, proibiu todo mundo de passear no shopping. O pai da Liliane estava desesperado em Goiânia. Isso nos trouxe grandes traumas. Tanto que interrompemos nossa amizade. E eu conheci os rótulos, pela primeira vez.

No campeonato, fiz o melhor tempo dos 100 metros nado peito entre as meninas da minha idade. Isso me fez ter novamente permissão para ir ao shopping com os coleguinhas. Foi uma das primeiras vezes, também, que me lembro de me culpar. E me lembro do individualismo das pessoas que "por culpa nossa" não foram ao shopping.

Fiz o que achava que era correto, mas o certo para mim era completamente criminoso para a técnica-professora-responsável pela equipe. E também para os demais. Muito estranho. O mundo de dentro não é o mesmo de fora? Aprendi também que não.

Quando cheguei de viagem, os amigos mais velhos da minha irmã tinham me apelidado de "revolts". Caramba, isso me marcou muito!

Hoje, quando escolho não andar de carro, não comprar mais roupa, não trocar de aparelho celular, não ter o título de professora-docente-superior só por ter, não seguir as modas televisísticas da academia, não bajular o reitor, não aceitar piadas racistas, amar alguém que mora longe, contrariar todas as regras de relacionamento que me soam falsas, considerar hipócritas antigas amizades, desfazer repetitivas convenções, me sinto, de fato, uma "revolts".

E pago por isso.